Sexualidade na fase idosa: amor, desejo e afeto continuam vivos.

Falar sobre sexualidade na velhice ainda é um tabu em muitos espaços inclusive entre os próprios idosos. Mitos como “sexo é coisa de jovem” ou “o desejo acaba com a idade” persistem, alimentados por uma cultura que valoriza excessivamente a juventude e invisibiliza os afetos e desejos de quem envelhece. Mas será que o desejo realmente desaparece com o tempo? Como lidar com perdas afetivas, transformações físicas e emocionais, e ainda manter viva a possibilidade de prazer, conexão e amor?

Para responder a essas e outras questões, a AFABB-SP conversou com Drª Albângela Ceschin Machado, psicanalista de casal formada pela Unifesp e pela SBPSP, e sexóloga pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). Com ampla experiência clínica e autora de diversos conteúdos sobre saúde emocional e sexual, Drª Albângela compartilha reflexões importantes sobre a vivência da sexualidade na fase idosa com sensibilidade, conhecimento técnico e respeito à diversidade de experiências.

Nesta entrevista, ela aborda temas como o impacto da menopausa e andropausa, os desafios do luto amoroso, o uso de medicamentos estimulantes, a importância da educação sexual para idosos e como a medicina e a psicologia podem ajudar a manter uma vida afetiva e sexual ativa em qualquer fase da vida.

  • Quais são os principais mitos que ainda cercam a sexualidade na terceira idade?

Drª Albângela: Um dos principais mitos é o de que o sexo é apenas para os mais jovens. Existe a ideia errônea de que o desejo acaba com a chegada da idade avançada. Claro, há mudanças por exemplo, a periodicidade pode não ser mais a mesma, mas isso não significa o fim da vida sexual.

Outro mito é o de que os idosos não sentem prazer. Tanto o prazer quanto o desejo estão diretamente ligados à intimidade, e os idosos continuam tendo plena capacidade de se conectar emocionalmente por meio de toques, carinho e troca afetiva. A sexualidade vai muito além do coito.

Muitas mulheres acreditam que a menopausa rouba o desejo sexual, o que não é verdade. Podem existir questões relacionadas a diversos fatores: físicos, emocionais e hormonais, mas o desejo não desaparece obrigatoriamente com a menopausa.

 

  • Por que a sociedade tende a invisibilizar o desejo e o afeto entre pessoas idosas?

Drª Albângela:  Podemos entender este aspecto como algo relacionado a cultura. O corpo idoso não é mais o corpo jovem, considerado belo segundo os padrões estéticos de uma sociedade que supervaloriza juventude e aparência. Assim como acontece com pessoas obesas ou com deficiência, os idosos acabam sendo excluídos da narrativa de que têm direito a viver sua sexualidade de forma plena.

O envelhecimento é muitas vezes associado à perda, decadência e invalidez. Um preconceito que nos é imposto culturalmente, e que precisa ser desconstruído.

 

  • Como lidar com o luto amoroso na velhice e a possibilidade de se abrir para um novo amor?

Drª Albângela:  É essencial trabalhar emocionalmente essa perda, seja por viuvez ou separação e, compreender que quem permanece vivo tem o direito de viver novas experiências. Cada pessoa tem seu tempo, e o medo do novo pode surgir por insegurança ou por acreditar que não tem mais esse direito, como se viver um novo amor fosse uma forma de trair a relação anterior.

Mas é importante lembrar: a vida continua e, com ela, as possibilidades de afeto também.

 

  • Quais são os impactos da menopausa, andropausa e outras mudanças fisiológicas na vida sexual?

Drª Albângela:   Primeiramente, é importante destacar que andropausa e menopausa não são equivalentes.

A menopausa marca o fim do período fértil da mulher e pode trazer alterações físicas e emocionais importantes, como ressecamento vaginal, mudanças na textura da pele e dos cabelos, irritabilidade e até depressão. Os sintomas variam de mulher para mulher e devem ser acompanhados por um ginecologista.

A chamada "andropausa" não ocorre em todos os homens da mesma forma e nem sempre está associada à velhice. Quando ocorrem alterações hormonais relevantes, elas devem ser avaliadas por um urologista.

 

  • Como a medicina e a psicologia podem ajudar a manter uma vida sexual ativa e satisfatória nessa fase?

Drª Albângela:   Os idosos devem cuidar da saúde emocional e sexual da mesma forma que cuidam da saúde física, com acompanhamento de especialistas.

 

  • Que tipo de educação sexual deveria ser oferecida para pessoas idosas?

Drª Albângela:   Esclarecer o que é mito ou tabu e proporcionar um acolhimento e uma orientação adequada sem preconceitos ou juízo de valor.

 

  • Como falar sobre prevenção de DSTs com esse público?

Drª Albângela:   Entender as dificuldades que possam surgir de uma formação tradicional e desatualizada, proporcionar por profissionais especializados em sexualidade humana uma nova oportunidade de vivenciar a vida sexual.

 

  • O uso de medicamentos estimulantes, como os voltados para disfunção erétil, tem se tornado mais comum entre pessoas idosas. Como a senhora avalia o impacto desses medicamentos na vivência da sexualidade na velhice, tanto do ponto de vista físico quanto emocional?

Drª Albângela:   Estes medicamentos devem ser usados mediante acompanhamento médico e em caso de necessidade, não se trata de uso recreativo, como muitas vezes jovens fazem uso equivocadamente.

Esses medicamentos trouxeram novas possibilidades para quem tem problemas orgânicos que variam e não necessariamente seja indicado só para idosos.

É sabido que houve uma revolução no comportamento sexual de homens idosos e impactou também nas mulheres que tiveram que se readaptar a uma realidade diferente daquela que viviam.

As consequências podem ou não desestabilizar emocionalmente relações acomodadas.

 

  • Que mensagem a senhora deixaria para os idosos que têm medo ou vergonha de viver o amor novamente?

Drª Albângela:   Eu diria que nós viemos, somos produto do sexo, e ele nos acompanha até o fim da vida, dentro do ciclo vital em diferentes fases da vida de uma maneira valorosa para a qualidade de vida e bem estar, portanto, é a possibilidade de amor por si mesmo e com compartilhamento se desejado.

 

COLABORAÇÃO

 Drª Albângela Ceschin Machado

Psicanalista de casal e Sexóloga.

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